Boyhood’s End é um jogo que desafia as convenções do terror sci-fi, transportando o jogador para um futuro distópico onde a humanidade é governada por uma entidade mecânica omnipotente. Combinando elementos de aventura, quebra-cabeças e uma narrativa profunda, este título apresenta uma experiência que prende desde o primeiro momento. Mesmo estando ainda incompleto, com apenas um capítulo disponível, consegue criar uma atmosfera intensa e perturbadora. A sua arte pixel detalhada e a utilização magistral do som são apenas alguns dos aspetos que contribuem para a imersão total do jogador neste mundo sombrio. Com influências claras de ficção científica clássica e uma abordagem moderna aos temas do controlo social e da desumanização, Boyhood’s End promete ser uma experiência memorável.
Jogabilidade
Boyhood’s End oferece uma jogabilidade que mistura elementos de vários géneros de forma fluida e orgânica. O jogo incorpora quebra-cabeças envolventes, segmentos interativos baseados em QTE e sequências de exploração onde cada detalhe conta. Apesar de se assemelhar a um romance visual em termos de apresentação, não se limita a simples escolhas de diálogo, oferecendo uma experiência mais dinâmica e envolvente. Uma das maiores limitações da jogabilidade é o facto de os diálogos e as cutscenes avançarem automaticamente, retirando alguma agência ao jogador. Esta decisão pode ser frustrante, especialmente considerando a importância da narrativa. No entanto, o jogo compensa com a forma como utiliza os seus diferentes elementos mecânicos para reforçar a imersão, tornando cada interação significativa. Os momentos de decisão e os finais negativos reforçam a tensão, criando uma sensação de vulnerabilidade constante.

Mundo e história
A história de Boyhood’s End é, sem dúvida, um dos seus pontos mais fortes. Situado num futuro distópico governado por uma IA omnipotente chamada R. Karellen, o jogo apresenta um sistema social onde cada indivíduo é avaliado com base num índice humano. Este sistema determina tudo, desde o acesso a bens essenciais até ao direito à própria vida. Os que acumulam pontuações baixas enfrentam marginalização extrema, enquanto os que atingem pontuações elevadas vivem em privilégio absoluto. O protagonista, Giovanni, encontra-se na base desta hierarquia, sendo constantemente ostracizado e impedido de aceder a recursos fundamentais. O jogo aborda temas pesados como bullying, opressão e o impacto de uma sociedade controlada por máquinas. No entanto, não se limita a estes temas mais comuns, utilizando-os como trampolim para explorar ideias mais complexas e inesperadas. A introdução de elementos de horror sci-fi, como inteligências artificiais sencientes e fanatismo religioso máquino, expande a narrativa de forma surpreendente. O resultado é um mundo rico em detalhes e camadas, onde cada revelação acrescenta à sensação de desespero e impotência do protagonista.
Grafismo
O estilo artístico de Boyhood’s End é um dos aspetos que mais contribui para a sua atmosfera distinta. A arte pixel desenhada à mão dá vida ao mundo distópico de forma impressionante, conseguindo equilibrar simplicidade e detalhe para criar um ambiente visualmente marcante. O jogo utiliza a falta de nitidez e os visuais estilizados para reforçar a sua temática de horror sci-fi, evocando um sentimento de desconforto e estranheza ao longo de toda a experiência. Cada cenário é construído com um cuidado meticuloso, transmitindo informação não apenas através do texto, mas também da própria composição visual. Pequenos detalhes, como o reflexo desesperado de Giovanni no ecrão do computador enquanto lê mensagens de bullying, são exemplos brilhantes da forma como o jogo utiliza os seus visuais para reforçar a narrativa. Existem alguns bugs visuais e falhas menores, mas nada que comprometa significativamente a experiência.

Som
O design de som de Boyhood’s End é um elemento fundamental para a sua identidade. Em vez de recorrer a vozes para dar vida aos personagens, o jogo aposta numa combinação de silêncio, efeitos sonoros inquietantes e uma banda sonora imersiva. Esta abordagem funciona excecionalmente bem dentro da sua temática, permitindo que o jogador se envolva completamente com a narrativa sem distrações desnecessárias. A música acompanha de forma eficaz os momentos mais tensos e misteriosos do jogo, reforçando a atmosfera opressiva e claustrofóbica. Os efeitos sonoros, por sua vez, são usados com precisão cirúrgica para criar um ambiente perturbador. Desde ruídos mecânicos a murmúrios distantes, cada som contribui para uma sensação constante de inquietação.
Conclusão
Boyhood’s End é uma obra que surpreende pela sua profundidade e execução. O primeiro capítulo consegue estabelecer um mundo rico e envolvente, onde cada elemento é cuidadosamente pensado para reforçar a sua atmosfera distópica e opressiva. A combinação de uma narrativa poderosa, uma jogabilidade envolvente e um design audiovisual impressionante torna este jogo uma experiência memorável. O maior problema de Boyhood’s End é o facto de ainda estar incompleto, deixando os jogadores ansiosos por mais. No entanto, a qualidade do que já está disponível justifica plenamente o investimento, especialmente considerando o seu preço acessível. A história está apenas a começar, mas já demonstra um potencial imenso para se tornar um dos jogos mais marcantes do seu género. Para os fãs de ficção científica e terror, Boyhood’s End é um título que não pode ser ignorado.