Análise: Bygone Dreams: Prophecy

Bygone Dreams: Prophecy é o prólogo jogável de um projeto ambicioso que pretende oferecer uma experiência de ação e fantasia num mundo de sonho profundamente estilizado. Com raízes em mitologias eslavas e folclore medieval bósnio, o jogo apresenta-se como um soulslike com elementos de RPG, onde o combate exigente e o design artístico ocupam um lugar de destaque. Desenvolvido com paixão evidente por uma equipa independente, o jogo conquistou alguns prémios de mérito visual e teve reconhecimento por parte da Epic Games, o que cria alguma expectativa em torno do seu potencial. Apesar disso, é um jogo que, nesta fase inicial, demonstra tanto promessas como limitações. Prophecy funciona como um prólogo com os dois primeiros níveis, oferecendo entre duas a três horas de conteúdo, dependendo do nível de dificuldade escolhido e da experiência do jogador.

Jogabilidade

Bygone Dreams tenta posicionar-se dentro do género soulslike, com combates desafiantes e uma estrutura de exploração relativamente linear, mas com alguns caminhos alternativos. A base do sistema de combate assenta numa combinação entre armas corpo a corpo, magia e armas de longo alcance, com a possibilidade de personalizar o estilo de jogo através de equipamentos. Existe um sistema de buffs e debuffs interessante, tanto nas armas como nos ataques inimigos, o que adiciona profundidade às escolhas do jogador. A mecânica de parry está bem ajustada, com uma dificuldade equilibrada, e o jogo oferece uma quantidade generosa de itens de cura, o que permite alguma margem de erro sem comprometer o desafio. No entanto, os combates com bosses revelam inconsistências de design. O primeiro boss usa indicadores no chão para telegráficos dos ataques, semelhantes aos que vemos em MMOs como World of Warcraft, mas mal visíveis devido à paleta de cores apagada e à falta de contraste. Já o segundo boss abandona completamente esse sistema, exigindo que o jogador leia as animações do modelo. Esta mudança abrupta na linguagem de jogo quebra as expectativas e prejudica a coerência da experiência. Acresce a isto a ausência de checkpoints antes de algumas batalhas, o que obriga o jogador a repetir longos segmentos após uma derrota, algo que mesmo jogos como Elden Ring já evitaram com soluções modernas como os Stakes of Marika. O sistema de dificuldade Heroico adiciona variantes aos bosses e introduz novos inimigos, sendo uma abordagem positiva à dificuldade, mas que poderia beneficiar de mais equilíbrio e fluidez nos controlos.

Mundo e história

A narrativa de Bygone Dreams decorre no mundo de Lume, uma terra de sonhos protegida por uma divindade matrona e agora ameaçada por um terrível Pesadelo. O jogador encarna Wa, um espírito que representa a última esperança do mundo, numa missão para libertar os Guardiões corrompidos por esta ameaça. A premissa é interessante e oferece potencial para uma construção de mundo rica e única, algo que se nota em certos momentos, tanto na escrita como nas cutscenes dobradas. Apesar disso, a história não consegue destacar-se por completo. Há um esforço claro em criar um universo mitológico e místico, mas muitos dos elementos narrativos parecem reciclados de outras obras dentro do género. A sensação é a de que se está a caminhar por terreno já muito explorado, sem surpresas marcantes ou personagens memoráveis. Para alguns jogadores, isso não será um problema, mas para quem procura uma narrativa fresca, pode deixar a desejar. As mais de duas horas de cenas com voz ajudam a dar vida ao mundo, mas nem sempre são suficientes para prender a atenção.

Grafismo

É na direção artística que Bygone Dreams mais brilha. Os cenários são visualmente ricos, com um forte apelo à natureza e ao fantástico, e as criaturas que habitam o mundo são criativas e bem concebidas. Existe uma clara inspiração em universos como Spiderwick ou Arthur e os Minimoys, com designs que remetem para fábulas e histórias encantadas. Os modelos dos inimigos e bosses, especialmente o primeiro, demonstram atenção ao detalhe e contribuem para uma identidade visual distinta. No entanto, este mérito artístico é manchado por problemas técnicos e falta de polimento. O stuttering presente na primeira área pode afastar jogadores logo nos primeiros minutos, e o desempenho geral deixa a desejar, com elevada utilização da GPU mesmo em definições médias. Além disso, embora os ambientes sejam bonitos, sentem-se muitas vezes vazios, com pouca interação e caminhos que divergem sem razão clara, o que pode tornar a exploração aborrecida e desmotivadora.

Som

A banda sonora é um dos elementos mais fortes do jogo, composta por mais de 50 faixas originais que combinam orquestração épica com instrumentos tradicionais. Esta fusão ajuda a criar uma atmosfera imersiva e condizente com o tom onírico e mitológico do mundo de Lume. Há uma sensibilidade musical clara, e as composições funcionam bem tanto em momentos de combate como em exploração ou cenas cinemáticas. As vozes, presentes nas cutscenes, são competentes e demonstram um esforço para elevar a componente narrativa. Ainda assim, há momentos em que a dobragem parece um pouco forçada ou pouco natural, o que pode quebrar a imersão. Os efeitos sonoros cumprem o seu papel, embora não se destaquem particularmente, e poderiam beneficiar de um pouco mais de impacto nos combates, especialmente ao usar ataques especiais ou feitiços.

Conclusão

Bygone Dreams: Prophecy é um vislumbre de um projeto com alma, criatividade e uma visão clara, mas que ainda precisa de muito trabalho para atingir o seu verdadeiro potencial. A jogabilidade tem boas ideias, mas tropeça na execução, especialmente em questões de design de bosses e checkpoints. O mundo construído tem identidade, mas ainda não convence totalmente pela narrativa. Visualmente, o jogo tem charme e estilo, mas é limitado por problemas de desempenho e falta de interação com os cenários. A música e o ambiente sonoro são de qualidade, oferecendo uma experiência auditiva envolvente.

No estado atual, não é um título que se recomende sem reservas. Há um embrião de algo especial aqui, e se a equipa de desenvolvimento conseguir resolver os problemas técnicos e afinar as mecânicas, Bygone Dreams pode transformar-se numa experiência marcante dentro do género. Para já, é uma amostra promissora, mas que ainda não está pronta para o palco principal. O talento está lá — agora é preciso tempo, paciência e polimento.

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