O cenário pós-apocalíptico continua a ser um dos mais explorados nos videojogos, com dezenas de títulos a tentar reinventar ou aprofundar uma fórmula já bem conhecida. Quando a Angry Bull Studio lançou Survive the Fall, a promessa era simples: uma abordagem distinta ao género, com uma atmosfera mais contemplativa e menos focada na constante agressividade do mundo exterior. Longe do típico “fim do mundo provocado por humanos”, aqui o apocalipse tem origem numa catástrofe natural — a queda de um cometa. E é nessa premissa que Survive the Fall se tenta destacar, apostando num equilíbrio entre exploração, construção de base e sobrevivência. O resultado é um jogo com ideias sólidas, uma execução funcional, mas que fica aquém do seu potencial em várias frentes.
Jogabilidade
Survive the Fall divide a sua jogabilidade em dois modos distintos: exploração de mundo aberto com vista aérea e gestão da base dos sobreviventes. Ao longo do jogo, o jogador controla até três personagens que percorrem três biomas de tamanho considerável, recolhendo recursos, enfrentando inimigos e tentando manter a comunidade viva. Cada membro da equipa traz competências únicas, como caça, forragem ou até simples queixas sobre as más condições de vida. A gestão de recursos é central, e o loot é abundante — por vezes, excessivamente. Desde armas e comida a sucata e pontos de investigação, tudo parece ter utilidade, mas o inventário torna-se rapidamente um caos. A ausência de um sistema de organização eficaz transforma o ecrã numa confusão visual, dificultando a navegação e retirando fluidez à experiência. Apesar disso, o sistema de crafting é robusto e recompensa a experimentação. O combate, por sua vez, mistura armas corpo-a-corpo e de longo alcance, com uma variedade razoável de opções e melhoramentos. Existe até uma funcionalidade de pausa para dar ordens, algo útil para quem prefere um ritmo mais estratégico. No entanto, as animações são pouco refinadas, a deteção de colisões é irregular, e a inteligência artificial dos inimigos raramente representa um desafio real. O resultado são confrontos que raramente impressionam, oscilando entre o funcional e o esquecível.

Mundo e história
A narrativa de Survive the Fall parte de uma premissa promissora: o mundo foi dizimado por um cometa e uma substância tóxica chamada Stasis, forçando os sobreviventes a reorganizarem-se em pequenos núcleos de resistência. Apesar do conceito, a história principal raramente se destaca. Os protagonistas são pouco carismáticos, e a apresentação por imagens estáticas não ajuda a criar envolvimento emocional. Apesar disso, o jogo ganha pontos na construção do ambiente e das facções. Algumas personagens secundárias têm momentos interessantes, e as decisões do jogador — alianças, ações e prioridades — influenciam o rumo dos acontecimentos e os possíveis finais. É neste sistema de escolhas que se encontra parte do charme do jogo, mesmo que a execução narrativa geral careça de impacto. O ambiente pós-apocalíptico é também menos hostil do que o habitual. Em vez de uma constante sensação de perigo, Survive the Fall aposta numa atmosfera de calma perturbadora, como se a natureza estivesse a recuperar o seu espaço lentamente. Este tom mais sereno distingue o jogo de outros títulos do género, como Fallout, aproximando-se mais de experiências como Miasma Chronicles ou Tunguska: The Visitation.
Grafismo
Visualmente, Survive the Fall cumpre sem deslumbrar. A comparação com State of Decay é inevitável, já que ambos partilham um estilo gráfico semelhante. Os cenários estão bem detalhados, com ambientes densos e diversificados, desde zonas urbanas abandonadas a florestas tomadas por vegetação. Os inimigos apresentam um design coerente com o tom do jogo, ainda que pouco variado. No Steam Deck, o desempenho é surpreendentemente estável, mantendo 40-45 FPS em definições médias a baixas. O texto da interface, apesar de pequeno, é legível e não compromete a experiência portátil. Já no PC, mesmo com uma placa gráfica competente como a RTX 4060, surgem inconsistências no ritmo de fotogramas, com quebras frequentes que perturbam a fluidez. Estes microstutters não estão presentes no Steam Deck, apontando para possíveis problemas de otimização específicos da versão para desktop. A ausência de tecnologias modernas de escalonamento, como DLSS, FSR ou XeSS, é notória e inexplicável em pleno 2025. Esta falha exclui jogadores com hardware mais modesto e contrasta com o restante desempenho técnico, que é razoável, mas sem surpresas.

Som
O design sonoro de Survive the Fall é um dos seus pontos mais fracos. A banda sonora é escassa e torna-se repetitiva durante as longas sessões de exploração, com faixas que se repetem de forma demasiado evidente. Os efeitos sonoros nas lutas carecem de impacto, o que diminui o peso dos combates e retira intensidade às batalhas. A ausência de vozes não é surpreendente, tendo em conta a dimensão do projeto, mas contribui para que a narrativa soe menos envolvente, sobretudo quando comparada com títulos do mesmo género que apostam em interpretações vocais. Esta falta de profundidade sonora faz com que o mundo de Survive the Fall nunca pareça totalmente vivo, reforçando a sensação de que há um fosso entre a ambição do conceito e a sua execução prática.
Conclusão
Survive the Fall é um jogo que tenta destacar-se dentro de um género saturado com uma abordagem menos agressiva ao pós-apocalipse, aliando elementos de gestão, exploração e narrativa não-linear. A sua premissa interessante e o sistema de construção funcional oferecem um bom ponto de partida, especialmente para jogadores que gostam de equilibrar exploração com construção e estratégia. Contudo, o jogo sofre com vários problemas técnicos, uma interface genérica, combate pouco refinado e um design sonoro fraco. O resultado é uma experiência que, embora nunca seja má, raramente atinge o nível de excelência que poderia alcançar com mais polimento. Quem conseguir ultrapassar estas limitações encontrará aqui uma aventura sólida e com bastante conteúdo — entre 50 a 100 horas, dependendo do nível de envolvimento. Com mais trabalho na otimização, melhorias na apresentação visual e sonora e um refinamento geral das suas mecânicas, Survive the Fall poderia facilmente competir com os grandes nomes do género. Por agora, é uma proposta competente para quem procura algo novo no mundo dos sobreviventes pós-apocalípticos, mas que não deixa de sentir a queda do seu próprio potencial.