Análise: Quartet

Quartet é o mais recente RPG da Something Classic Games, estúdio conhecido por Shadows of Adam. Este novo título é bastante mais ambicioso, oferecendo uma experiência que mistura elementos clássicos do género com ideias modernas e uma narrativa envolvente. À primeira vista, pode parecer apenas mais um jogo inspirado na era 16-bit, mas rapidamente se revela algo muito mais profundo.

O jogo começa com uma abordagem semelhante a Wild ARMs, onde o jogador escolhe uma de quatro personagens para iniciar a aventura. Temos Nikolai Proch, um sargento desiludido do exército, Ben Balani, um cozinheiro frustrado, Cordelia Helmont, uma licenciada em direito dedicada, e Alexandra Hin, uma jovem comerciante a lutar para manter a sua vida em ordem. Cada um tem o seu próprio capítulo introdutório, com uma duração de duas a três horas. Após estas introduções, as histórias convergem e formam um grupo de oito personagens, que acompanha o jogador até ao final do jogo. Cada membro do grupo tem uma personalidade bem distinta, capaz de conquistar diferentes tipos de fãs de RPG. A única pena é que apenas quatro personagens tenham capítulos de introdução, deixando os outros a precisarem de mais contexto inicial.

Quartet é um jogo que não se limita a seguir fórmulas antigas, oferecendo uma narrativa complexa, personagens memoráveis e mecânicas que, apesar de clássicas, têm pequenos toques modernos que tornam a experiência mais dinâmica.

Jogabilidade

O sistema de combate em Quartet segue a fórmula tradicional por turnos, mas com algumas particularidades interessantes. Durante as batalhas, quatro personagens estão ativas enquanto as outras quatro ficam em espera, podendo ser trocadas a qualquer momento sem penalizações. Esta mecânica permite que os personagens em standby recuperem lentamente, incentivando o jogador a alternar constantemente e a usar estratégias variadas.

Todos os personagens recebem experiência após as batalhas, garantindo que ninguém fica para trás em termos de progressão. As masmorras têm um bom equilíbrio de duração, sem se tornarem cansativas ou demasiado curtas, embora haja momentos em que os caminhos podem ser difíceis de visualizar devido a estruturas que bloqueiam a visão.

Além do combate, algumas masmorras incluem puzzles ou mini-jogos que trazem variedade à jogabilidade. Um exemplo marcante é uma secção em que o jogador tem de atravessar um corredor enquanto evita tiros inimigos, escolhendo cuidadosamente quando se esconder e quando avançar. Estes momentos estão bem implementados, adicionando dinamismo sem quebrar o ritmo do jogo.

Quartet também inclui um mini-jogo de cartas chamado Oracle, semelhante ao famoso Triple Triad de Final Fantasy VIII. Neste jogo, os jogadores escolhem cinco cartas com números em cada lado e colocam-nas num tabuleiro 3×3. Se o número de um lado da carta for superior ao da carta adjacente do adversário, essa carta muda de cor. Embora não haja tantos jogadores espalhados pelo mundo como em Final Fantasy VIII, encontrar adversários é sempre divertido.

Em termos de dificuldade, Quartet oferece um desafio equilibrado. O velho truque de atacar e curar constantemente não funciona aqui. É essencial explorar as fraquezas dos inimigos e recorrer a habilidades que causam estados negativos, mesmo contra bosses, algo que lembra a série Shin Megami Tensei.

O jogo não inclui opções como auto-save ou ajustes de dificuldade, algo que pode frustrar alguns jogadores. Guardar o progresso só é possível fora de combate e os pontos de recuperação são raros, pelo que é fácil perder bastante progresso se o jogador se esquecer de gravar. A gestão de recursos, especialmente de itens de cura e dinheiro, é vital, já que o jogo tem uma baixa taxa de encontros aleatórios e o dinheiro ganho raramente é suficiente para comprar tudo o que é necessário.

Mundo e história

O enredo de Quartet gira em torno do poder da magia, visto por diferentes grupos como recurso ou religião. Estas visões opostas geram conflitos políticos e guerras, afetando todas as camadas da sociedade. Através das várias personagens, o jogador vê como a guerra impacta tanto os soldados na linha da frente como os civis que acreditam estar distantes do conflito.

A narrativa é séria e, por vezes, pesada, abordando temas complexos de forma madura. No entanto, o jogo equilibra bem esses momentos com instantes de humor e pequenas situações mais leves. A escrita é cuidada, com diálogos que revelam detalhes do mundo sem recorrer a longos blocos de texto expositivos.

Uma das melhores partes da narrativa está nas interações entre as personagens, que ajudam a desenvolver as suas relações e personalidades. Contudo, quando o grupo se reúne, a urgência da situação deixa pouco espaço para mais momentos de descontração. Missões opcionais no final do jogo expandem bastante estas relações, explorando histórias pessoais e conflitos não resolvidos de cada personagem, sendo altamente recomendadas.

O jogo também incentiva a exploração, oferecendo locais secretos acessíveis apenas com o dirigível, recompensando os jogadores mais atentos com conteúdo extra que enriquece ainda mais a narrativa e a preparação para os desafios finais.

Grafismo

Visualmente, Quartet começa como um típico RPG 2D inspirado nos clássicos 16-bit, com sprites e tiles coloridos. No entanto, à medida que o jogador avança, começa a notar a riqueza dos detalhes, especialmente na arquitetura e na variedade das cidades, cada uma com características únicas que refletem as culturas que as inspiraram.

As personagens jogáveis têm sprites distintos, que refletem as suas origens e possuem animações cuidadosas. As expressões faciais estão muito bem trabalhadas e dão vida aos diálogos. Os bosses, por outro lado, são grandes e imponentes, criando uma sensação de desafio visualmente marcante.

Os cenários de combate são variados e bem detalhados, com alguns até animados, como batalhas em cima de um comboio em movimento. O mapa do mundo, no entanto, é mais simples e lembra clássicos como Chrono Trigger.

Um ponto negativo está na fonte padrão do texto, que pode ser difícil de ler devido ao seu estilo pixelizado. Felizmente, o jogo oferece opções de fontes mais nítidas, como a HD, que melhora bastante a legibilidade.

Som

A banda sonora de Quartet é inicialmente discreta, mas vai crescendo em qualidade à medida que o jogo avança. Cada local tem um estilo musical próprio que ajuda a dar-lhe identidade. Por exemplo, a cidade de Seren tem uma música animada ao estilo jazz de Nova Orleães, enquanto Luskiya apresenta temas com influências do leste europeu em tons mais sombrios.

As músicas de combate e dos bosses não têm o impacto imediato que se espera em batalhas, mas com o tempo acabam por se tornar memoráveis, encaixando bem na atmosfera geral do jogo.

Este cuidado em adaptar o som à narrativa e aos locais visitados contribui bastante para a imersão, tornando o mundo de Quartet mais vivo e credível.

Conclusão

Quartet é um RPG independente que consegue superar as expectativas com uma narrativa rica, personagens memoráveis e um sistema de combate estratégico que recompensa a experimentação. O jogo combina elementos clássicos com toques modernos, oferecendo uma experiência que apela tanto a veteranos do género como a novos jogadores.

Apesar de algumas falhas, como a ausência de auto-save e o facto de apenas metade das personagens ter capítulos de introdução, estas limitações não prejudicam significativamente a experiência geral.

Com cerca de 28 horas de conteúdo, Quartet oferece uma aventura sólida e envolvente. É um jogo que merece a atenção de qualquer fã de RPGs e que demonstra como títulos independentes podem competir com produções de maior escala, tanto em qualidade como em profundidade narrativa.

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