Análise: Atelier Resleriana: The Red Alchemist & the White

A série Atelier da Gust e Koei Tecmo continua a provar que a alquimia, quando bem trabalhada, pode ser o coração de um JRPG memorável. Depois do experimental Atelier Yumia, que apostou numa estrutura mais aberta e num sistema de combate em tempo real, Atelier Resleriana: The Red Alchemist & the White Guardian marca um regresso às origens da série. É um título que combina o melhor dos clássicos Atelier com as inovações dos capítulos mais recentes, entregando uma experiência que tanto homenageia os fãs de longa data como acolhe os novos jogadores. Resleriana destaca-se pela forma como conjuga uma narrativa emocional com mecânicas profundas e acessíveis, um sistema de alquimia viciante e um combate por turnos cheio de nuances estratégicas.

O jogo apresenta duas protagonistas: Rias Eidreise e Slade Clauslyter, dois jovens marcados por uma tragédia que devastou a sua terra natal, Hallfein, doze anos antes. O desaparecimento de toda a população num mar de neblina vermelha é o ponto de partida para uma história que mistura perda, esperança e descoberta. A missão de ambos passa por restaurar a cidade e desvendar o mistério por detrás do desastre, mas o que começa como uma jornada pessoal rapidamente se transforma numa aventura maior, que envolve múltiplos mundos e personagens de toda a história da série Atelier.

Atelier Resleriana é, acima de tudo, um tributo à herança da franquia. É um jogo que recorda o que fez a série especial — a alquimia, as personagens cativantes e o ciclo de exploração e criação — ao mesmo tempo que mostra a maturidade da Gust em equilibrar nostalgia e modernidade.

Jogabilidade

Depois de algumas experiências com sistemas híbridos, Resleriana traz de volta o combate totalmente por turnos. Cada batalha é cuidadosamente estruturada, com um sistema de turnos visível no ecrã que permite planear ataques, buffs e debuffs com precisão. Existe ainda a possibilidade de realizar bloqueios manuais para reduzir dano — uma novidade subtil mas eficaz — que adiciona um toque de interação em tempo real. Para quem prefere um ritmo mais clássico, o jogo oferece a opção de bloqueio automático.

O sistema Unity é o grande destaque do combate. À medida que os personagens atacam, a barra Unity enche-se, permitindo executar ataques combinados e acções em cadeia entre membros da equipa. Quando os jogadores dominam as combinações certas, as batalhas transformam-se em espetáculos de luz e poder, com ataques elementares a desencadear reações em cadeia devastadoras. Por exemplo, usar uma bomba de gelo seguida de um feitiço elétrico pode resultar num ataque adicional que duplica o dano. Esta mecânica dá uma sensação constante de descoberta e recompensa, tornando cada combate uma oportunidade de experimentar novas estratégias.

A alquimia é, como seria de esperar, outro dos pilares centrais. O sistema foi reformulado e agora baseia-se na combinação de cores e atributos. Cada ingrediente tem cores laterais que, quando ligadas de forma harmoniosa, criam objetos com propriedades únicas — desde armas mais fortes a itens de apoio com efeitos especiais. Há duas fases de mistura: a primeira é obrigatória e forma a base do item; a segunda é opcional, mas permite aperfeiçoar o resultado, aumentar o número de usos e adicionar novas características. Esta segunda fase é onde a alquimia revela a sua profundidade, permitindo a descoberta de receitas inéditas através da combinação de materiais específicos.

Com o avançar do jogo, surgem novas camadas — como a clonagem e o aprimoramento de itens — e a ajuda das fadas, pequenas criaturas que auxiliam na síntese e gestão de recursos. Tudo isto é introduzido de forma gradual, para que o jogador nunca se sinta sobrecarregado. O resultado é um sistema de alquimia acessível, mas com profundidade suficiente para os fãs mais dedicados passarem horas a experimentar combinações.

Mundo e história

Hallfein, a cidade onde tudo começa, é quase uma personagem viva. O enredo gira em torno da sua restauração, liderada por Camilla, irmã de Rias. O jogador é constantemente incentivado a melhorar os distritos da cidade, o que não só altera a aparência do local — tornando-o mais vibrante e cheio de vida —, como desbloqueia novos comerciantes, receitas e oportunidades de lucro. O envolvimento emocional com a reconstrução é um dos pontos altos do jogo, pois há uma sensação real de progresso visível, tanto narrativo como visual.

Rias e Slade são protagonistas com um peso emocional raro na série. Ambos partilham o trauma de uma perda profunda e a sua jornada é marcada por momentos de ternura e reflexão. A relação entre os dois é bem escrita, com diálogos que revelam vulnerabilidade e determinação. A história, que dura cerca de 40 horas, é direta, mas deixa espaço para futuras continuações — algo a que a Gust já nos habituou nas trilogias anteriores.

Outro ponto interessante é a integração de personagens de jogos passados da série. Chamados Wanderers, estes visitantes de outros mundos aparecem de forma natural na narrativa e servem como pontes de nostalgia para os fãs veteranos. Totori, Rorona, Willbell e Raze são apenas alguns dos nomes que regressam, e embora o jogador não precise de conhecer os seus passados para compreender o enredo, as suas presenças enriquecem o mundo e tornam-no mais dinâmico.

Além da história principal, há uma grande variedade de missões secundárias centradas na relação com os habitantes de Hallfein. Estas interações não são meros preenchimentos: ajudam a reforçar o sentido de comunidade e trazem recompensas tangíveis, como novos materiais de alquimia e aliados para combates mais difíceis. Este ciclo de conhecer, ajudar e crescer é uma das maiores forças de Atelier Resleriana.

Grafismo

Visualmente, Atelier Resleriana é um dos jogos mais impressionantes da série. As personagens apresentam um detalhe notável, com expressões faciais vivas e animações fluidas. Cada cenário, desde os caminhos dimensionais mágicos às florestas e minas, é colorido e luminoso, mantendo a identidade artística característica da série. O design de Hallfein é especialmente marcante: começa como uma cidade cinzenta e despovoada e transforma-se, gradualmente, num local cheio de cor, bandeiras e vida.

Nem tudo é perfeito, contudo. Alguns ambientes sofrem de texturas datadas e contrastam com o cuidado dado aos modelos das personagens. Apesar disso, o estilo artístico é consistente e mantém um charme visual que é difícil não apreciar.

A interface é clara, personalizável e pensada para longas sessões de jogo. Existem opções de tamanho de texto e filtros de cor, o que demonstra atenção à acessibilidade. As batalhas são um deleite visual, com efeitos de partículas vibrantes e uma paleta de cores que reforça o tom mágico da aventura. Mesmo com alguns pequenos problemas de fluidez em certas plataformas, o desempenho é sólido e a experiência geral é fluida e agradável.

Som

A componente sonora está à altura da tradição da Gust. A banda sonora de Atelier Resleriana mistura composições novas com temas familiares de capítulos anteriores. Os fãs reconhecerão melodias reinterpretadas, como faixas de Atelier Ayesha, que trazem um toque de nostalgia. Cada área tem a sua própria atmosfera musical, e o jogo permite criar listas de reprodução personalizadas para evitar repetições — uma funcionalidade simples mas muito bem-vinda.

Os efeitos sonoros mantêm o padrão de qualidade habitual, desde o tilintar do vidro no laboratório até o som dos ataques elementares em combate. A ausência de vozes em inglês pode desapontar alguns jogadores, mas o elenco japonês entrega performances emocionais e consistentes, transmitindo bem o peso emocional da história.

O tema final é particularmente notável, encapsulando a essência da jornada de Rias e Slade: uma mistura de melancolia, esperança e determinação. Tal como o jogo, a música sabe equilibrar o passado e o presente, o conforto e a descoberta.

Conclusão

Atelier Resleriana: The Red Alchemist & the White Guardian é uma celebração de tudo o que torna a série Atelier especial. É um regresso às raízes que não teme inovar, um título que respeita a herança da franquia ao mesmo tempo que oferece novas ideias. O sistema de combate é envolvente e estratégico, a alquimia é profunda e recompensadora, e a narrativa tem um coração raro nos JRPGs modernos.

Embora apresente algumas falhas menores — como certas texturas menos trabalhadas e pequenos momentos de pausa no ritmo —, estas nunca comprometem a experiência geral. A Gust mostra aqui um domínio completo da fórmula que a tornou reconhecida: a fusão entre o quotidiano tranquilo e a fantasia, entre a criação e a aventura.

Para os veteranos da série, Resleriana é um verdadeiro presente, repleto de referências e reencontros com personagens queridas. Para os novos jogadores, é uma porta de entrada acolhedora para um universo encantador, que não exige conhecimento prévio mas recompensa a curiosidade.

Em suma, Atelier Resleriana é mais do que apenas mais um capítulo — é uma reafirmação do espírito da série. Um jogo que combina emoção, estratégia e criatividade de forma exemplar, provando que a alquimia da Gust continua tão poderosa como sempre.

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