Análise: Shrine’s Legacy

Shrine’s Legacy é um jogo que nos transporta diretamente para a era dourada dos RPGs de ação dos anos 90. Desenvolvido pela Positive Concept Games, o título é uma homenagem evidente aos clássicos da Super Nintendo, tanto no visual como na estrutura de jogo. É um tributo aos tempos em que os mundos eram simples mas cheios de imaginação, onde a aventura e o sentido de descoberta bastavam para nos prender ao ecrã durante horas. A pergunta que se impõe é se Shrine’s Legacy consegue capturar não só o aspeto, mas também o encanto e profundidade daqueles jogos que marcaram uma geração.

A história começa com uma lenda antiga sobre Aklor, uma entidade maléfica que quase destruiu o mundo de Ardemia, apenas sendo detido pela heroína Kailee Shrine e pela poderosa Espada de Shrine, alimentada por oito gemas mágicas. Séculos mais tarde, a paz volta a ser ameaçada e os rumores do regresso de Aklor começam a espalhar-se. A aventura recomeça, e é neste contexto que o jogador é lançado num RPG que mistura combate em tempo real, exploração e uma boa dose de nostalgia.

Jogabilidade

Logo no início, Shrine’s Legacy introduz-nos a um breve tutorial de combate, através de uma sequência onde uma figura encapuçada é emboscada. É aqui que o jogador aprende as bases do sistema de luta corpo a corpo e do lançamento de feitiços, tudo de forma intuitiva e direta. Pouco depois conhecemos Rio, o protagonista, descendente de Kailee Shrine e novo portador da lendária espada.

O combate é simples mas satisfatório. É possível atacar inimigos diretamente, alternar entre magias e utilizar habilidades especiais. O jogo aposta numa jogabilidade fluida que evoca títulos como The Legend of Zelda: A Link to the Past, com uma abordagem mais de ação do que de estratégia. Um dos aspetos mais interessantes é o modo cooperativo para dois jogadores, que se desbloqueia pouco depois de iniciar a campanha. Cada jogador pode controlar um herói, e caso um deles caia em batalha, o outro pode revivê-lo. Se ambos forem derrotados, é fim de jogo.

Um detalhe que reforça o espírito retro é a ausência de gravação automática. É necessário gravar manualmente, tal como nos RPGs da era 16-bit. Esquecer-se de o fazer pode custar uma hora de progresso, o que adiciona um risco e tensão que muitos jogos modernos já perderam. Há também um modo de cronometragem para quem gosta de speedruns, e menus detalhados onde se podem ajustar opções, verificar o mapa e consultar o estado das personagens.

Mundo e história

A narrativa de Shrine’s Legacy é construída com leveza e humor, recheada de personagens carismáticas e situações que quebram a seriedade da missão principal. Rio é um jovem determinado a seguir o legado dos seus antepassados, desejando provar que é digno da Espada de Shrine. Ao longo da jornada, junta-se a Reima, uma utilizadora de magia com sede de vingança contra Aklor.

A missão dos dois é recolher as oito gemas elementares que restauram o verdadeiro poder da espada, permitindo-lhes enfrentar o mal que ameaça Ardemia. Este enredo simples é sustentado por um mundo cheio de pormenores, aldeias vibrantes e templos misteriosos. Cada área introduz novos desafios e personagens, criando uma sensação constante de progressão e descoberta.

Há ainda um sistema de personalização através das Jóias, artefactos mágicos que conferem habilidades especiais às personagens. Existem 32 no total, cada uma com vantagens únicas, como exibir um minimapa nas masmorras ou aumentar a defesa. Contudo, só podem ser equipadas em pontos de gravação, obrigando o jogador a planear com cuidado a sua estratégia.

Grafismo

Visualmente, Shrine’s Legacy é uma carta de amor aos RPGs clássicos da Super Nintendo. Os cenários coloridos e detalhados evocam memórias de Chrono Trigger e Secret of Mana, especialmente quando o modo cooperativo está ativo e vemos duas personagens a percorrer o mesmo ecrã.

Os sprites são nítidos e animados com fluidez, transmitindo expressividade mesmo com a simplicidade dos gráficos 16-bit. As aldeias, florestas e masmorras são cheias de pequenos detalhes, desde flores a brilhar até partículas de magia que dançam no ar. O design de inimigos é variado, com criaturas que parecem saídas de um manual de fantasia clássica.

No entanto, há um pequeno problema: certos elementos do cenário, como árvores ou paredes, podem por vezes bloquear a visão do jogador, dificultando o combate ou a exploração. É um inconveniente menor, mas que pode quebrar momentaneamente o ritmo de jogo. Fora isso, Shrine’s Legacy é um festim visual para qualquer fã da estética retro.

Som

A banda sonora de Shrine’s Legacy é um dos seus maiores triunfos. Cada faixa parece cuidadosamente composta para capturar o espírito das cenas em que toca. As melodias variam entre temas leves e alegres em aldeias, e composições intensas e tensas em confrontos com inimigos.

O primeiro encontro com Aklor é acompanhado por um poderoso tema de órgão, transmitindo de imediato a sensação de perigo e imponência da criatura. Também os efeitos sonoros são bem integrados, com tons específicos associados ao texto das falas que refletem a personalidade de cada personagem. Os sons graves e ameaçadores que acompanham Aklor contrastam com os mais leves e cómicos dos companheiros de Rio, criando uma paisagem sonora viva e coerente.

Este cuidado com o som reforça o charme do jogo e demonstra o quanto os desenvolvedores compreenderam a importância da música e da ambiência na criação de um verdadeiro RPG clássico.

Conclusão

Shrine’s Legacy é mais do que uma homenagem nostálgica: é uma recriação competente e apaixonada de uma época em que a simplicidade técnica era compensada pela alma e pela criatividade. A Positive Concept Games conseguiu capturar a essência dos grandes títulos dos anos 90 sem se limitar a copiá-los, oferecendo uma experiência autêntica que brilha tanto em jogabilidade como em atmosfera.

Com um sistema de combate sólido, cooperação a dois jogadores, personalização estratégica e uma história leve mas envolvente, o jogo tem tudo para agradar aos fãs do género. A ausência de auto-save e algumas pequenas falhas visuais podem irritar os menos pacientes, mas para os jogadores que cresceram com cartuchos e ecrãs de tubo, estas limitações fazem parte do encanto.

Shrine’s Legacy é uma viagem no tempo, uma lembrança de quando cada batalha e cada descoberta eram uma recompensa em si. Para quem sente falta dos RPGs de ação da Super Nintendo, este é um regresso a casa.

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