Antevisão: skate.

A série Skate marcou uma geração de jogadores no final dos anos 2000, oferecendo uma abordagem distinta e mais realista em comparação com o estilo frenético e exagerado de Tony Hawk’s Pro Skater. Em 2025, a EA decidiu trazer a franquia de volta com um novo título em acesso antecipado, que, segundo a própria produtora, não é uma sequela, remake ou remaster, mas sim uma evolução. No entanto, a evolução proposta parece mais uma transformação radical, que deixa para trás muito do que tornava os jogos originais especiais. Este novo Skate surge como um produto fortemente moldado pelas tendências atuais de jogos como serviço e modelos free-to-play, sacrificando autenticidade e identidade em nome da monetização e acessibilidade.

Ainda que mantenha algumas das bases que cimentaram a sua jogabilidade, o jogo perde-se em escolhas que retiram personalidade, ambiente e ligação ao legado da franquia. O resultado é um título que, apesar de alguns acertos técnicos, cria uma enorme frustração em fãs que esperavam o regresso daquilo que os antigos Skate representavam.

Jogabilidade

Um dos aspetos mais positivos de Skate continua a ser o sistema de controlo. A sensação de estar em cima de uma prancha mantém-se única, com uma jogabilidade acessível mas também profunda para quem quer dominar as manobras. Os truques continuam associados ao analógico direito, a direção ao analógico esquerdo, os grabs aos gatilhos e os grinds ao posicionamento do jogador. É um sistema que equilibra intuição e profundidade, e que continua a ser a principal razão pela qual vale a pena experimentar o jogo.

No entanto, nem tudo é positivo. A rotação parece mais rígida do que nos jogos anteriores e a assistência nos grinds é demasiado automática, tornando a execução menos satisfatória. Alguns movimentos icónicos da série estão ausentes, como o skitching, e a física apresenta falhas, especialmente nas transições de rampas, onde por vezes o jogador perde inexplicavelmente o momentum. Há também uma ausência de truques adicionais que ajudavam a diversificar o estilo de cada jogador.

Pior do que isso é a forma como o jogo foi estruturado. Ao contrário das experiências offline dos títulos anteriores, este Skate é exclusivamente online, com desafios diários e progressão bloqueada por objetivos repetitivos e pouco inspirados. O design parece mais próximo de um jogo mobile do que de um título com identidade própria, o que mina grande parte da diversão.

Mundo e história

Se nos títulos originais existia uma clara progressão acompanhada por personagens autênticas, aqui o jogo falha em quase todos os aspetos narrativos. A cidade de San Vansterdam não tem alma nem consistência, funcionando mais como um grande skatepark do que como um espaço vivo. A ausência de autenticidade reflete-se não apenas na arquitetura simplista e estéril, mas também no elenco de personagens.

No lugar de um cameraman realista, que dava personalidade e humor às gravações dos truques, temos agora uma aplicação de inteligência artificial chamada Vee, que representa talvez o pior personagem da série até hoje. As falas robóticas e infantilizadas retiram qualquer ligação emocional com o jogador e dão ao jogo um tom artificial, completamente diferente do ambiente cru e divertido dos originais.

Além disso, desapareceu a sensação de risco e impacto das quedas. Com a justificação in-game de uma tecnologia chamada ImpervaTEK, os skaters não sofrem lesões, o que elimina elementos memoráveis como os efeitos de raios-x e os ossos partidos das quedas. Essa decisão transforma o jogo numa experiência demasiado higienizada, sem a irreverência que fazia parte da identidade da série.

Grafismo

Visualmente, Skate toma um rumo cartoonesco que dificilmente agrada a fãs da estética realista da trilogia original. Os modelos de personagens parecem saídos de um jogo da série Sims, com olhos exagerados, feições artificiais e roupas estilizadas de forma demasiado genérica. O estilo gráfico pode ser considerado mais acessível, mas carece de detalhe, textura e autenticidade.

San Vansterdam, apesar de ser grande em conceito, sente-se limitada em prática. As paredes lisas, superfícies imaculadas e ausência de pormenores retiram credibilidade ao ambiente urbano. Pior ainda, a falta de variedade entre as zonas torna a exploração pouco apelativa, com cada espaço a parecer apenas uma variação de skatepark sem vida real.

Problemas técnicos também marcam presença. Jogadores a teletransportarem-se, clipping constante entre personagens e falhas gráficas, como estradas a transformarem-se em superfícies negras sem textura, são frequentes e quebram a imersão. O resultado é uma cidade que não convida à exploração e que não consegue transmitir a mesma sensação de lugar vivido que existia em San Vanelona, por exemplo.

Som

Curiosamente, o aspeto sonoro é um dos pontos fortes deste novo Skate. O trabalho nos efeitos sonoros está muito bem conseguido, captando a essência da prática do skate com realismo e detalhe. O som das rodas a rolar, da madeira a raspar em diferentes superfícies e do metal a bater nos corrimões cria uma verdadeira sinfonia que acompanha o jogador em cada manobra. Há momentos em que este realismo quase induz uma sensação meditativa, trazendo de volta a autenticidade que falta noutros aspetos do jogo.

Já a música e o diálogo não têm a mesma qualidade. A banda sonora inclui cerca de 100 músicas, mas a maioria é recente, ignorando em grande parte clássicos que poderiam atrair a audiência nostálgica da série. O resultado é uma playlist pouco equilibrada e com pouca diversidade histórica.

O diálogo, por outro lado, é um dos pontos mais negativos. As falas exageradas, pouco naturais e cheias de tentativas falhadas de humor retiram credibilidade a todo o conjunto. É notório que o tom infantilizado foi escolhido para tornar o jogo mais acessível a públicos jovens, mas acaba por alienar os fãs mais antigos e afastar qualquer resquício de autenticidade.

Conclusão

O novo Skate é um jogo que mantém viva apenas uma parte do legado da franquia: o sistema de controlo que continua a ser intuitivo e profundo. Infelizmente, quase tudo o resto foi substituído por um produto moldado para se adaptar às tendências dos jogos como serviço. O resultado é um título que sacrifica autenticidade em nome da monetização, da estética simplista e de uma abordagem artificial e infantilizada.

Se por um lado a jogabilidade ainda consegue oferecer momentos de diversão, por outro o ambiente, a progressão e o tom geral tornam difícil sentir a mesma ligação que os fãs tiveram com os jogos originais. A ausência de personalidade, a dependência de desafios repetitivos e a estética artificial criam uma experiência que, apesar de carregada do nome Skate, pouco tem da alma da série.

Em 2009, Skate 2 mostrou que a irreverência e o realismo podiam coexistir de forma brilhante. Em 2025, este novo Skate mostra exatamente o oposto: um jogo domesticado, higienizado e sem identidade, que prefere alinhar-se com o modelo de serviço e com a monetização agressiva em vez de ser uma verdadeira celebração da cultura do skate. Para quem procura autenticidade, os títulos antigos continuam a ser a melhor opção.

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *

ComboCaster