Análise: Dark Quest 4

Depois de várias incursões pela série Dark Quest, seria natural esperar mais um roguelite profundo e repetitivo, daqueles que vivem de corridas sucessivas e mapas gerados proceduralmente. A terceira entrada já tinha sido competente, mas o género começa a ficar saturado. Felizmente, Dark Quest 4 segue outro caminho e revela-se algo muito mais interessante. Esta nova abordagem é uma carta de amor direta aos clássicos jogos de tabuleiro, aqueles que imortalizaram noites de sexta-feira entre dados, miniaturas e muita imaginação. É um regresso ao espírito de HeroQuest, mas totalmente digital e com um charme próprio.

Jogabilidade
Dark Quest 4 assume-se de imediato como uma experiência de tabuleiro virtual. A jogabilidade é simples, limpa e profundamente táctica, mantendo sempre um equilíbrio entre acessibilidade e profundidade. O jogador controla um grupo de três heróis, inicialmente composto pelo Bárbaro, pelo Mago e pelo Anão. Tudo se desenrola num tabuleiro dividido por grelha, com ações realizadas através de cartas que representam ataques, habilidades ou movimentos especiais.

O jogo não tenta competir com RPGs complexos. Em vez disso, abraça o formato de jogo de tabuleiro e executa-o de forma exemplar. A campanha é composta por 30 missões criadas manualmente, evitando por completo a aleatoriedade que domina o género. A cada missão, o jogador prepara o seu grupo no acampamento, onde pode treinar novas cartas ou comprar poções. A componente estratégica cresce à medida que desbloqueamos mais heróis, até um total de dez personagens, incluindo um Lanceiro e uma Maga de Fogo.

O sistema de Fadiga adiciona um toque inteligente à fórmula. Depois de participarem numa missão, os heróis ficam com a vida reduzida até descansarem, obrigando o jogador a experimentar novas combinações. Esta rotação forçada mantém o jogo fresco e obriga a pensar para além das escolhas óbvias.

Mundo e história
A narrativa segue o tom clássico de um one-shot de Dungeons & Dragons. Um feiticeiro maléfico, através do seu necromante Gulak, anda a raptar aldeões para os transformar num grotesco monte de carne destinado a gerar novas criaturas. O Imperador convoca heróis para travar esta ameaça e cabe ao jogador atender ao chamado.

A atmosfera é acolhedora e envolvente, com o jogo a apresentar-se sempre como um tabuleiro físico animado. O acampamento, em particular, transmite uma sensação de reunião entre aventuras, com figuras iluminadas por velas, pequenas tendas e personagens que nos recebem como se estivéssemos numa mesa real. Apesar da simplicidade, o mundo tem identidade e mantém um charme quase nostálgico. Os inimigos vão de esqueletos e orcs a criaturas explosivas, incluindo frangos que se revelam mais perigosos do que aparentam, capazes de desencadear reações em cadeia devastadoras.

Grafismo
Visualmente, Dark Quest 4 aposta num estilo que mistura miniaturas de jogos de tabuleiro com ambientes digitais detalhados. As salas parecem recriações cuidadas de cenários físicos, com atenção a elementos como velas, espelhos dourados e retratos gigantes que reforçam o ambiente mágico e misterioso. A perspetiva isométrica ajuda a manter tudo claro e legível, permitindo ao jogador planear cada movimento com precisão.

As animações são simples mas eficazes, reforçando a sensação de estarmos a mover peças num tabuleiro. O jogo é surpreendentemente polido, com uma performance estável e sem falhas técnicas notáveis. No entanto, os controlos podiam ser mais fluidos: selecionar portas ou ladrilhos específicos é, por vezes, uma tarefa frustrante. A navegação nos menus também podia ser mais intuitiva, especialmente no acampamento.

Som
O som acompanha de forma competente o espírito de aventura clássica. A banda sonora alterna entre temas mais calmos para o acampamento e faixas mais tensas para os combates, sem nunca se tornar intrusiva. Os efeitos sonoros reforçam a ação das cartas e dos ataques, criando um ambiente quase táctil, como se estivéssemos realmente a lidar com miniaturas e peças físicas.

Apesar de não surpreender, o áudio cumpre bem o seu papel, mantendo a atmosfera acolhedora e ligeiramente misteriosa que define grande parte da experiência.

Conclusão
Dark Quest 4 é uma lufada de ar fresco no género dos dungeon crawlers independentes. Em vez de seguir a tendência dos roguelites repetitivos, aposta numa experiência focada, acessível e fiel ao espírito dos jogos de tabuleiro clássicos. A campanha de 12 a 15 horas já seria suficiente para justificar a aventura, mas o jogo vai muito além disso ao incluir cooperação para três jogadores, tanto online como local, proporcionando sessões descontraídas e perfeitamente alinhadas com a inspiração original.

O modo Criador é, no entanto, o verdadeiro trunfo. Permitindo construir mapas, colocar inimigos, criar missões e partilhá-las com a comunidade, transforma o jogo numa plataforma com potencial infinito.

Os controlos pouco refinados e uma economia demasiado generosa são defeitos que não mancham a qualidade geral. Dark Quest 4 apresenta-se como uma aventura sólida, acolhedora e cheia de personalidade, ideal para quem sente saudades daquela sensação única de abrir uma caixa de jogo numa noite de sexta-feira.

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