Análise: Escape the Backrooms

Escape the Backrooms é um jogo que se insere num fenómeno muito particular da cultura da internet moderna: o fascínio pelos espaços liminares e pelo terror criado de forma colaborativa por comunidades online. Se para muitos jogadores mais velhos, The Backrooms pode parecer apenas mais um creepypasta expandido, para os mais novos este universo é praticamente um folclore digital, com personagens, criaturas, mapas e níveis quase tão estudados como qualquer saga estabelecida. Escape the Backrooms chega agora à versão 1.0 depois de anos em Acesso Antecipado, consolidando-se como uma das interpretações mais completas e reconhecíveis deste universo. O resultado é um jogo de terror cooperativo em primeira pessoa que aposta muito mais no impacto visual e no choque do que na profundidade mecânica, mas que assume essa direção sem vergonha.

Jogabilidade

A jogabilidade de Escape the Backrooms é muito simples e até minimalista. O jogador não tem armas, não tem maneira de enfrentar as criaturas e, na maior parte do tempo, a única opção é explorar, fugir e tentar sobreviver até encontrar a saída do nível. Existe uma mecânica de sanidade, que vai diminuindo ao longo do tempo, e que deve ser gerida com o consumo de água de amêndoas espalhada pelos mapas. Para além disso, há pequenos puzzles ambientais que exigem atenção, como reconstruir uma escada, encontrar chaves ou ativar mecanismos.

A cooperação é onde o jogo realmente ganha vida. Jogar sozinho pode ser stressante e repetitivo, mas jogado em grupo transforma-se numa experiência cheia de sustos, risos nervosos e comunicação constante. Há momentos em que a desconfiança entra no meio, especialmente em níveis com criaturas como o skin-stealer, que se mascara de jogador e tenta enganar o grupo. É nesses momentos que o jogo atinge o seu melhor: quando a paranoia digital se mistura com o medo real.

No entanto, é importante reconhecer que a jogabilidade pode tornar-se repetitiva. A base da experiência é quase sempre a mesma: entrar num nível, explorar, fugir do monstro e encontrar a saída. Se o jogador procura um terror mais psicológico ou introspectivo, provavelmente não vai encontrar aqui.

Mundo e história

Escape the Backrooms funciona como uma espécie de museu interativo dedicado ao lore das Backrooms. Cada nível é uma interpretação de uma sala, corredor ou universo separado dentro desta mitologia digital. Encontramos o infinito corredor amarelo iluminado por lâmpadas fluorescentes, as salas de recreio distorcidas, piscinas vazias cheias de ecos, estacionamentos onde algo se move nas sombras e até áreas que parecem campos verdes sem fim.

Há aqui uma dualidade interessante. Para alguns jogadores, especialmente adultos que chegaram ao conceito através do fascínio pelos espaços liminares, o apelo está na estranheza silenciosa destes locais, que parecem memórias incompletas ou sonhos que já esquecemos. Já para os jogadores mais novos, o interesse está nas criaturas. Escape the Backrooms opta pela segunda abordagem. Os monstros são presença constante e interrompem quase sempre a possibilidade de contemplar o surrealismo inquietante dos níveis.

Ainda assim, a variedade de ambientes impressiona. Ao explorar os diferentes níveis, temos sempre a sensação de estar a percorrer algo maior do que nós, algo feito de fragmentos recolhidos de mentes espalhadas por todo o mundo.

Grafismo

O jogo apresenta visuais simples, quase lo-fi, que combinam surpreendentemente bem com o conceito. Os modelos de personagem e monstros são básicos e as animações por vezes parecem rígidas, mas isso não prejudica a atmosfera. Pelo contrário, reforça-a. Tal como um disco shoegaze precisa de ruído e eco para criar profundidade, os espaços liminares beneficiam de uma certa falta de nitidez, de algo que parece inacabado ou imperfeito.

Existem zonas em que gostaríamos de parar apenas para observar e absorver o ambiente, mas o ritmo do jogo raramente o permite. É uma pena, porque em vários níveis há paisagens assustadoramente bonitas, como se estivéssemos a visitar memórias perdidas de um sonho que já não conseguimos recordar completamente.

Som

O trabalho sonoro é eficaz e direto. O silêncio é usado como arma e as perseguições são acompanhadas de picos sonoros agressivos que aumentam a tensão e criam sustos bastante fortes. As vozes dos monstros, em particular, são inquietantes, sobretudo nos níveis em que tentam imitar jogadores. Não há muita subtileza na direção sonora, mas funciona dentro da filosofia do jogo: choque e adrenalina acima de suspense gradual.

Conlusão

Escape the Backrooms é um jogo que compreende o universo de onde nasceu e sabe o que quer oferecer. Não é um jogo de terror psicológico profundo, nem pretende construir atmosfera através de silêncio prolongado ou reflexão. É um jogo de exploração e sobrevivência pensado para ser vivido em grupo, para gerar sustos, gargalhadas nervosas e memórias partilhadas entre amigos. A repetição da jogabilidade e o uso constante de perseguições podem cansar, e há uma sensação constante de que o jogo não aproveita totalmente a atmosfera única dos níveis. No entanto, a variedade de ambientes, o respeito pelo lore comunitário e o valor da experiência cooperativa fazem de Escape the Backrooms uma viagem marcante a um dos mitos digitais mais fascinantes da atualidade.

Uma visita guiada aos recantos mais estranhos da imaginação coletiva da internet, mesmo que o guia esteja sempre com pressa.

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