Tales of Old: Dominus é um daqueles jogos independentes que tenta fazer mais do que muitos estúdios maiores ousariam. A Hvmana Industries MMD e a indie.io apostaram num RPG medieval onde combate, furtividade, sobrevivência, construção e gestão territorial coexistem num mesmo pacote, criando algo que, à partida, parece demasiado ambicioso para o seu próprio bem. A proposta mistura vingança pessoal com o crescimento de um herói que não só luta pela própria família, como ainda lidera uma rebelião e reconstrói um vilarejo devastado. É uma promessa grande e, apesar de nem sempre cumprir tudo com polimento, apresenta um mundo cru, denso e com escala suficiente para convencer quem gosta deste tipo de experiência.
O jogo abre com o clássico cenário da aldeia destruída, mas consegue atribuir-lhe peso emocional: Prima Nocta, rebeliões esmagadas, famílias despedaçadas. Não estamos perante um RPG leve ou cómico, mas sim uma visão mais suja e realista da idade medieval. É um título que quer puxar o jogador para dentro da lama, das ruínas e da luta pela sobrevivência. A soma da ambição, da atmosfera sombria e da tentativa de misturar géneros deixa claro que Dominus quer ser mais do que um RPG de combate; quer ser uma história de reconstrução e resistência.
Jogabilidade
O ponto mais evidente da jogabilidade é a amplitude. Tales of Old: Dominus tenta conjugar mundo semiaberto, combate em terceira pessoa, furtividade, sobrevivência, construção e gestão de recursos. É muita coisa para um estúdio indie, e isso sente-se logo no arranque. A jogabilidade tem influências claras de Kingdom Come: Deliverance, Mount & Blade e Medieval Dynasty, mas tenta tornar tudo mais acessível.
O combate utiliza armas históricas, arcos, flechas e ataques furtivos. Para quem está habituado a RPGs de fantasia cheios de magia, trocar bolas de fogo por uma flecha silenciosa ou uma lâmina escondida pode parecer estranho, mas acaba por ser refrescante. A vertente furtiva está surpreendentemente bem integrada, permitindo infiltrar territórios inimigos, eliminar guardas ou preparar emboscadas. O sistema de sobrevivência, com frio, fome e desgaste, acrescenta tensão, mas também pode ser frustrante quando se torna repetitivo ou demasiado punitivo.
A amplitude é tanto força como fraqueza. Há sempre algo para fazer, mas nem sempre tudo está no ponto. Certos sistemas precisam claramente de mais refinamento, desde o comportamento da IA até pequenas inconsistências no controlo da personagem. Apesar disso, quando tudo funciona em conjunto, a jogabilidade oferece momentos intensos e variados que fazem o jogador sentir que está a viver o crescimento de um líder, não apenas a combater como mais um aventureiro genérico.

Mundo e história
A narrativa de Tales of Old: Dominus gira à volta de vingança, reconstrução e resistência. Eric, o protagonista, regressa à aldeia natal apenas para a encontrar destruída após a Batalha das Noivas. A irmã foi sequestrada, o povo foi massacrado e o mundo parece decidido a esmagar qualquer tentativa de esperança. É uma história simples, mas carregada de intensidade, apoiada por uma ambientação sombria inspirada em períodos históricos reais.
O mundo lembra uma fusão de The Witcher com Game of Thrones, mas sem criaturas mágicas ou feitiçaria espalhafatosa. A crueldade é humana, os perigos são palpáveis e a política local é tão importante como a força bruta. A cada vila conquistada e a cada território recuperado, o jogador sente que está a reerguer algo que foi destruído, o que dá ao jogo uma motivação clara.
É também um jogo que tenta equilibrar narrativa pessoal com progressão estrutural. Não és apenas um herói solitário; és um líder emergente que organiza uma rebelião, constrói fortificações, recruta aliados e tenta impor ordem numa região devastada. Esta combinação de história emocional com escala territorial distingue-o de muitos outros RPGs independentes e dá-lhe uma identidade muito própria.
Grafismo
Dominus aposta numa estética medieval pesada, escura e suja. Não tenta ser glorioso ou romântico, mas sim brutal e realista. As aldeias queimadas, as florestas densas e os acampamentos improvisados criam uma atmosfera coerente com o tom do jogo. Há algo quase barroco na forma como a paisagem mistura decadência com ameaça constante.
No entanto, a qualidade gráfica não é uniforme. Em vários momentos, o jogo impressiona pela densidade visual e pela fidelidade histórica das armas e equipamentos. Noutros, existem animações rígidas, comportamentos estranhos da câmara e elementos que denunciam claramente o orçamento limitado. A câmara, em particular, é um dos pontos mais inconsistentes, por vezes movimentando-se de forma brusca ou enganadora.
A arte funciona ao serviço da imersão, mesmo quando falha tecnicamente. O ambiente transmite desconforto, peso e frieza, criando a sensação de que cada passo é dado num mundo hostil. Essa coerência estética, apesar das imperfeições, acaba por compensar as limitações técnicas.

Som
O áudio segue o mesmo caminho do grafismo: envolvente na intenção, irregular na execução. O ambiente sonoro recria bem a dureza do mundo medieval, com vento, passos, ecos e pequenos detalhes que tornam o ambiente mais crível. Os sons das armas têm o impacto necessário, especialmente arcos, flechas e golpes de lâmina.
A música mantém um tom discreto, quase sempre melancólico ou sombrio, ajudando a reforçar a sensação de opressão constante. Contudo, nem sempre está presente de forma consistente, e há momentos onde o jogo parece ficar demasiado silencioso, quebrando um pouco o ritmo.
Os efeitos ligados à sobrevivência, como frio ou fome, funcionam mas podem tornar-se repetitivos. Ainda assim, o som cumpre globalmente o seu papel de reforçar o peso do mundo e complementar a narrativa.
Conclusão
Tales of Old: Dominus é um RPG ambicioso, corajoso e cheio de ideias, mas nem sempre bem polido. Ao tentar misturar combate, furtividade, sobrevivência, construção e liderança num único jogo, acaba por assumir um escopo maior do que aquele que talvez conseguisse suportar. Mesmo assim, a visão é clara e a experiência distingue-se facilmente de outros RPGs indie.
A história de vingança e reconstrução, o foco na ascensão de um líder rebelde e o ciclo de conquistar, defender e administrar dão ao jogo uma sensação de escala rara. É o tipo de título que conquista pela atmosfera e pela profundidade dos sistemas, não pela perfeição técnica.
Para quem gosta de RPGs robustos, complexos e exigentes, Dominus pode revelar-se uma excelente surpresa. Para quem prefere algo mais direto e polido, talvez seja melhor esperar por atualizações ou refinamentos futuros. No entanto, mesmo com imperfeições, é um jogo que merece atenção pelo que tenta alcançar e pela forma como combina tantos elementos de forma coesa. Tales of Old: Dominus é imperfeito, mas marcante, e deixa clara a ambição de um estúdio que quer chegar mais longe.