Princess of the Water Lilies apresenta-se como um daqueles jogos que, à partida, parecem destinados a encantar. A premissa tem todos os ingredientes certos: um pequeno gato salvo de se afogar, criado por rãs carinhosas e presenteado com um colar mágico capaz de fazer florescer o mundo à sua volta. É uma base encantadora, digna de um daqueles contos ilustrados que se liam antes de dormir. Inspirado por plataformas como Ori e construído sobre biomas desenhados à mão, o jogo arranca com a sensação de estarmos perante algo mágico. No entanto, como tantas histórias prometedoras, a questão é saber se essa magia resiste ao longo da aventura ou se se perde no caminho.
A abertura funciona como um conto tradicional: um lago tranquilo, um lar improvisado entre rãs e um sentimento de bondade que dá ao jogo um calor particular. Mas rapidamente essa doçura é interrompida por eventos abruptos e estranhamente desconexos, que tentam transformar a aventura numa corrida contra o tempo, mas acabam por comprometer o ritmo. Esta dualidade entre encanto e frustração torna-se, infelizmente, uma constante ao longo de Princess of the Water Lilies.
Jogabilidade
A jogabilidade gira em torno de um colar mágico e da capacidade do pequeno gato de ronronar. À superfície, é um conceito simples e simpático: o ronronar desperta cogumelos adormecidos, move vinhas ou ativa pequenos truques ambientais que desbloqueiam caminhos. A mecânica é, na teoria, uma boa forma de combinar puzzles ambientais com progressão física, mas rapidamente revela fragilidades.
O ataque do gato, curiosamente, volta a ser um comando de ronronar, mesmo que o animal tenha garras perfeitamente capazes. É uma decisão estranha, que contribui para a sensação de que a jogabilidade nunca encontra o seu próprio ritmo. Muitas interações dependem de criaturas específicas que precisam de ser atraídas ou manipuladas no momento certo, mas a sua resposta é inconsistente. Por vezes o cogumelo avança como previsto, outras simplesmente ignora o jogador, descontrolando toda a sequência.
A plataforma sofre ainda mais com estes problemas. Vários desafios dependem de sincronismos extremamente apertados entre a posição de um cogumelo e o tempo de existência de uma plataforma, que desaparece cedo demais ou tarde demais. O jogador vê-se preso num ciclo de tentativa e erro onde a falha raramente é culpa sua, mas sim da imprecisão do próprio jogo. Além disso, alguns obstáculos bloqueiam o caminho caso o jogador não tenha consigo um caracol ou inseto específico, obrigando a regressar atrás apenas para ir buscar esse elemento. É um tipo de retrocesso que não acrescenta nada à progressão, apenas atrasa. Softlocks acontecem com mais frequência do que seria aceitável, exigindo a morte deliberada ou reinícios completos. Mesmo a ligação de um comando só funciona se estiver ligado antes do jogo arrancar. A tudo isto junta-se o facto de um único golpe ser suficiente para matar o jogador, forçando repetições longas quando o autosave decide ser parcimonioso.
Há também alguns combates contra bosses, mas estes nunca se destacam, funcionando mais como interrupções momentâneas do que como momentos marcantes. No final, a jogabilidade de Princess of the Water Lilies quer ser delicada e mágica, mas acaba por ser rígida, frustrante e demasiado dependente de sistemas pouco fiáveis.

Mundo e história
O jogo estrutura o seu mundo em várias regiões centrais: uma floresta, uma enorme árvore e uma caverna profunda. São cenários que cumprem a função, mas raramente se transformam em algo memorável. Há um sistema de viagem rápida, mas este é operado por um sapo gigante que surge enterrado no chão sem grande explicação. A sua colocação é muitas vezes tão pouco prática que regressar a áreas anteriores pode implicar repetir cadeias inteiras de puzzles.
A narrativa começa com delicadeza. O ambiente do lago, a adoção do gato e a construção desta pequena família de rãs têm autenticidade e afeto. No entanto, o jogo quebra esse tom com a introdução repentina de um dinossauro mecânico, uma criatura que parece ter saído diretamente de um universo estilo Horizon Zero Dawn. A sua aparição explosiva destrói a floresta e queima o ambiente envolvente, mas a forma como essa sequência é apresentada retira-lhe impacto. A câmara empurra o jogador para a direita, mas depois impede a progressão até o dinossauro se aproximar, criando não tensão, mas frustração. Depois desse momento, o enredo tenta manter alguma coerência emocional, mas as regiões visitadas não oferecem história visual suficiente para aprofundar o mundo. A sensação é de que o jogo queria ser uma fábula, mas nunca chega a abraçar totalmente esse papel. Falta desenvolvimento, falta identidade e falta continuidade temática entre as áreas exploradas.
Grafismo
Graficamente, Princess of the Water Lilies aposta num estilo desenhado à mão, suave e caloroso. As cores são quentes, as animações simples e fluidas, e os primeiros minutos ao lado da família de rãs têm um charme evidente. É fácil perceber a intenção artística: criar um conto ilustrado interativo.
No entanto, o estilo raramente ultrapassa essa primeira impressão. Os biomas acabam por se confundir entre si, sendo demasiado genéricos e sem elementos marcantes capazes de permanecer na memória. Há momentos com algum brilho visual, mas falta diversidade, profundidade e detalhe suficiente para se destacarem no panorama atual dos jogos de plataformas desenhados à mão, um espaço onde a concorrência é forte e muitas obras já elevaram o padrão. Ainda assim, mesmo quando o resultado não impressiona, há uma certa delicadeza no trabalho gráfico que não se perde completamente. É agradável, mas nunca verdadeiramente deslumbrante.

Som
No campo sonoro, Princess of the Water Lilies divide-se entre efeitos que rapidamente passam despercebidos e uma banda sonora orquestral que, embora não atinja níveis memoráveis, consegue transmitir alguma serenidade. As melodias sobem e descem em ondas suaves, acompanhando a ação com um toque quase cinematográfico.
Os efeitos sonoros, por outro lado, são pouco inspirados. O ronronar do gato, as pequenas criaturas e os elementos ambientais cumprem o essencial, mas raramente acrescentam carácter ao jogo. A música é claramente o destaque, mesmo que não ofereça nenhum tema verdadeiramente marcante. Funciona como pano de fundo, sustentando a atmosfera quando a jogabilidade não o consegue fazer.
Conclusão
Princess of the Water Lilies começa com um brilho especial. A adoção de um pequeno gato por uma família de rãs, o colar mágico que floresce o mundo e a tranquilidade do lago criam uma introdução calorosa e promissora. No entanto, essa promessa vai-se diluindo à medida que os problemas mecânicos se acumulam. O jogo quer transmitir ternura e maravilha, mas a frustração com puzzles inconsistentes, plataformas que desaparecem no momento errado e criaturas que se recusam a colaborar transforma essa magia num esforço constante.
A arte tem encanto, mas não é marcante. A música é bonita, mas não memorável. A narrativa tem coração, mas carece de desenvolvimento. Tudo isto contribui para um jogo que tem alma, mas não a consegue fazer brilhar. Princess of the Water Lilies podia ter sido uma pequena pérola no género, mas acaba por ser uma experiência irregular, que encanta no início mas perde o rumo demasiado cedo. É uma aventura com boas intenções, mas que raramente alcança o encanto que o seu próprio conto promete.