Wartales é um daqueles jogos que surpreendem pela profundidade que consegue atingir num género já saturado. Desde o seu lançamento, a produção da Shiro Games tem vindo a expandir-se com atualizações e conteúdos adicionais que acrescentam novas dimensões à sua fórmula de sobrevivência e gestão num mundo medieval brutal e sem lei. Contract: The Fief é a mais recente expansão e promete uma mudança significativa: a possibilidade de governar o nosso próprio domínio. No entanto, como acontece em Wartales, o poder traz sempre responsabilidades — e nem todas as novidades funcionam da forma mais satisfatória. Esta análise procura avaliar até que ponto este novo conteúdo consegue enriquecer a experiência principal e se o sonho de ser senhor feudal é realmente tão glorioso como parece.
Jogabilidade
Contract: The Fief introduz uma camada de gestão de território que se destaca do estilo tradicional do jogo base. Em vez de apenas liderarmos um grupo de mercenários em batalhas e contratos, agora podemos conquistar e administrar um feudo, construindo edifícios, produzindo bens, assegurando a segurança e felicidade da população e expandindo o território distrito a distrito. É uma mudança de ritmo interessante, quase transformando Wartales num jogo de estratégia e simulação de cidade.
A progressão é marcada pelo descanso — cada vez que o grupo acampa, o tempo avança e a construção ou produção dentro do feudo progride. Há uma sensação constante de evolução, com novos edifícios e melhorias a desbloquear, mas também uma pressão constante para manter o equilíbrio entre recursos, moral e segurança. A forma como as necessidades da população — comida, educação, proteção e entretenimento — influenciam diretamente a estabilidade do domínio é um dos pontos mais fortes da expansão.
Contudo, nem tudo funciona de forma fluida. As decisões de design mais recentes retiraram parte da conveniência e do impacto prático das mecânicas. Inicialmente, era possível aceder remotamente ao baú do feudo e aos comerciantes locais, o que facilitava a gestão de inventário e a reparação de equipamento. Mas com as atualizações, estas funcionalidades foram removidas, obrigando o jogador a deslocar-se fisicamente ao castelo. O resultado é um sistema mais realista, mas também mais frustrante e pouco recompensador em termos de ritmo de jogo.

Mundo e história
O castelo situa-se em Mount Altis, uma nova área localizada entre as regiões de Tiltren e Ludern. A sua conquista é relativamente acessível, exigindo apenas derrotar um pequeno grupo de bandidos de nível médio. Uma vez controlado, o castelo torna-se a base de operações do jogador, um símbolo do seu poder e da sua capacidade de liderança.
O mundo de Wartales continua a ser impiedoso e moralmente cinzento, e o sistema de governo introduzido nesta expansão reforça essa dualidade. Podemos escolher ser um tirano autoritário, um governante justo, um comerciante ganancioso ou um líder do povo. As leis que promulgamos, os edifícios que construímos e até as pessoas que contratamos moldam a identidade do feudo. Esta personalização ideológica dá profundidade ao jogo e acrescenta um elemento de roleplay bastante sólido.
No entanto, a narrativa emergente que nasce das decisões políticas poderia ser mais explorada. Apesar de as mecânicas de gestão sugerirem um sistema de consequências dinâmico, muitas decisões acabam por ter impacto limitado. As promessas de criar um refúgio próspero ou uma fortaleza de opressão raramente se refletem de forma tangível na forma como o mundo reage. Ainda assim, o conceito de moldar um domínio à nossa imagem continua a ser uma das ideias mais fascinantes que Wartales já apresentou.
Grafismo
Visualmente, Contract: The Fief mantém a qualidade sólida que caracteriza Wartales. O castelo e os distritos são desenhados com o mesmo cuidado e detalhe das restantes regiões do jogo. Cada novo edifício acrescenta vida ao cenário — mercados animados, campos férteis, tavernas movimentadas — e a sensação de crescimento gradual é bem transmitida através da arte.
A direção visual reforça a atmosfera sombria e realista que define o jogo. As cores continuam a ser discretas, com tons terrosos e iluminação naturalista que ajudam a manter a coerência estética do mundo medieval decadente. No entanto, não há grandes novidades gráficas. O novo conteúdo utiliza essencialmente os mesmos recursos visuais do jogo base, o que pode desiludir quem esperava uma evolução técnica mais evidente.
Mesmo assim, a escala do castelo e o detalhe das estruturas conseguem transmitir uma sensação de imponência. Ver o nosso domínio crescer, pedra a pedra, é recompensador, e o jogo continua a ser visualmente consistente com o seu tom narrativo.

Som
O design sonoro segue a linha minimalista do original, privilegiando a ambientação em detrimento de composições épicas. O som do vento entre as muralhas, o martelar dos ferreiros e o murmúrio das tavernas criam uma paisagem auditiva imersiva e funcional. A música é usada com parcimónia, reforçando os momentos de reflexão ou decisão política.
Ainda assim, o DLC poderia beneficiar de uma banda sonora mais distintiva. As novas áreas e edifícios mereciam temas musicais próprios, algo que sublinhasse a importância de cada espaço e o progresso do jogador como senhor feudal. A ausência dessa diferenciação faz com que o ambiente sonoro, apesar de competente, pareça demasiado familiar e pouco memorável.
Conclusão
Wartales – Contract: The Fief é uma expansão ambiciosa, com uma premissa excelente e ideias que podiam ter elevado o jogo a um novo patamar. A gestão de um feudo acrescenta uma dimensão estratégica e narrativa interessante, permitindo que o jogador molde o seu próprio domínio num mundo hostil. A forma como o poder é representado — tanto como ferramenta de ordem como de corrupção — encaixa perfeitamente no tom moralmente ambíguo da série.
Infelizmente, algumas decisões de design e alterações posteriores prejudicam parte da experiência. A remoção de funcionalidades práticas, como o acesso remoto ao baú e aos comerciantes, torna o sistema mais pesado e menos intuitivo. A economia do feudo também carece de coerência, com a moeda local a ser rejeitada por vários NPCs, e muitos edifícios a oferecer apenas bónus passivos em vez de interações significativas.
Mesmo assim, há mérito na tentativa de diversificar o gameplay e de oferecer aos jogadores um novo papel dentro do mundo de Wartales. Para quem gosta de microgestão e de construir algo mais duradouro do que um grupo de mercenários, este conteúdo pode ser bastante satisfatório. O DLC não revoluciona o jogo, mas dá-lhe uma nova camada de profundidade e propósito.
No fim, Contract: The Fief reflete o espírito do próprio Wartales — um jogo de ambição, sacrifício e poder, onde as boas intenções podem facilmente perder-se na burocracia da sobrevivência. Ainda imperfeito, mas inegavelmente intrigante, é um passo ousado para um dos RPGs de estratégia mais singulares dos últimos anos.