Mandragora: Whispers of the Witch Tree é uma nova proposta da Primal Game Studio que chega ao mercado como um RPG de ação em 2.5D com claras inspirações no género souls-like. Situado num mundo de fantasia sombria onde o caos e a decadência dominam, este título procura oferecer uma experiência desafiante e envolvente, capaz de cativar tanto os fãs mais exigentes dos jogos de ação como os apaixonados por universos fantásticos. Apesar de à primeira vista parecer apenas mais um jogo com estética genérica de fantasia, Mandragora surpreende com a sua ambição e atenção ao detalhe.
Desde o início, o jogo deixa transparecer que se trata de uma obra construída com paixão e uma clara visão artística. A estrutura do jogo, o sistema de combate, o design do mundo e até os elementos de progressão mostram uma tentativa séria de criar uma experiência distinta, mas familiar, para quem já está habituado a este tipo de jogos. Embora o enredo possa não ser o ponto mais forte do título, o conjunto geral é surpreendentemente sólido e convida à exploração e à experimentação.
Jogabilidade
Mandragora é, acima de tudo, um jogo exigente e recompensador. A sua jogabilidade assenta numa combinação de combate técnico, exploração meticulosa e um sistema de progressão que encoraja escolhas significativas. Ao iniciar o jogo, o jogador pode escolher entre seis classes distintas: Vanguard, Flameweaver, Spellbinder, Nightshade, Wyldwarden e Vindicator. Cada uma destas classes oferece um estilo de jogo único, com vantagens e desvantagens bem definidas, o que proporciona uma excelente base para rejogabilidade. O combate em Mandragora é intenso e precisa de precisão. Os inimigos podem ser fatais em segundos se o jogador não estiver atento, o que exige reflexos rápidos e um bom conhecimento das mecânicas. A rotação entre esquivas, ataques e uso de habilidades é fluída e responsiva, e embora as mecânicas sejam típicas do género, o jogo consegue encontrar espaço para se destacar, nomeadamente através da forma como permite atribuir comandos personalizados às habilidades, o que acrescenta variedade e profundidade ao combate.
O sistema de progressão baseado numa árvore de habilidades oferece várias opções, embora nem todas as melhorias tenham impacto imediato. Algumas parecem ter efeito mínimo, o que pode causar alguma frustração em fases mais avançadas, onde o jogador espera sentir mais claramente os frutos do seu progresso. Ainda assim, a existência de equipamento diversificado, magias e itens consumíveis dá liberdade suficiente para personalizar a abordagem ao combate e adaptar-se a diferentes desafios.
Além disso, há elementos de metroidvania ligeiros implementados de forma inteligente. Algumas áreas só se tornam acessíveis após obter certas habilidades, como um gancho ou a capacidade de quebrar pisos frágeis. Isto incentiva a exploração cuidadosa e a revisita de zonas previamente visitadas, premiando o jogador mais atento e persistente.

Mundo e história
O universo de Mandragora é um dos seus maiores trunfos. O jogo decorre no mundo de Faeldumm, um local sombrio e opressivo onde a entropia parece inevitável. O jogador assume o papel de um Inquisidor ao serviço do Rei Sacerdote, cuja missão inicial é caçar hereges e manter a ordem. No entanto, um acontecimento traumático leva o protagonista a questionar o seu papel e a iniciar uma jornada de descoberta e rebelião contra a autoridade imposta.
Apesar de a premissa ser relativamente comum dentro do género — a de um protagonista que rompe com o sistema —, o jogo evita cair em clichés fáceis ao relegar a narrativa principal para segundo plano, deixando que a imersão no mundo surja através de interações opcionais, conversas com NPCs e a observação do ambiente. Esta abordagem pode afastar quem procura uma história guiada e centrada no personagem principal, mas recompensa quem estiver disposto a investir tempo a explorar e a descobrir os detalhes do mundo por si mesmo. O conceito de entropia é central ao enredo e ao ambiente. Tudo parece estar em decadência: as cidades estão abandonadas, as florestas infestadas de monstros e o próprio céu parece pesar sobre o jogador. É uma fantasia que se sente distante e próxima ao mesmo tempo, como se refletisse a fragilidade da nossa própria realidade através de um espelho distorcido. É essa sensação de estranheza reconfortante que torna Faeldumm memorável, mesmo quando a narrativa não prende totalmente.
O jogo inclui também um hub central chamado Witch Tree, que serve como ponto de encontro e descanso para o jogador. Aqui podem ser encontrados aliados, comerciantes, e até um quadro de recompensas. É também possível melhorar os serviços disponíveis, o que reforça a sensação de evolução e progresso fora do combate direto.
Grafismo
Visualmente, Mandragora é uma obra notável. A sua apresentação em 2.5D permite uma riqueza de detalhe rara neste tipo de jogos. Cada zona do mundo é distinta, com uma direção artística carregada de personalidade. Desde cavernas profundas com armadilhas a céu aberto, até florestas assombradas ou templos arruinados, cada cenário foi cuidadosamente construído para transmitir a sensação de decadência e mistério.
Os ambientes estão repletos de elementos visuais que contam histórias por si só. Restos de civilizações, criaturas estranhas, edifícios em ruínas e uma paleta de cores sombria e saturada criam uma atmosfera que não deixa margem para dúvidas quanto ao tom do jogo. As animações, embora não revolucionárias, são competentes e eficazes, especialmente nas sequências de combate onde a clareza visual é essencial para reagir aos ataques inimigos. É também de destacar o design dos inimigos, que combina uma estética grotesca com criatividade. Há uma clara intenção de causar desconforto visual, sem cair no exagero gratuito. Esta coerência estética reforça a imersão e contribui para a sensação constante de estar num mundo hostil e imprevisível.

Som
O departamento sonoro de Mandragora está à altura da sua componente visual. A banda sonora é discreta, mas eficaz, servindo como pano de fundo emocional que acompanha o jogador sem distrair. As composições musicais reforçam o ambiente de melancolia e tensão, sendo especialmente bem utilizadas nas secções mais perigosas do jogo. No entanto, é o trabalho de vozes que mais se destaca. Os diálogos com NPCs estão bem interpretados e ajudam a dar vida ao mundo, mesmo quando o jogador opta por não seguir todas as linhas de conversa. A qualidade da locução é alta, e a entrega das falas é convincente, o que contribui para aumentar o impacto das interações. Os efeitos sonoros são nítidos e bem posicionados. O som das armas, dos feitiços, dos monstros e até dos próprios passos transmite uma sensação táctil importante num jogo onde o feedback auditivo pode ditar a sobrevivência. É possível distinguir os padrões de ataque dos inimigos apenas pelo som, o que acrescenta uma camada de profundidade ao combate para os jogadores mais atentos.
Conclusão
Mandragora: Whispers of the Witch Tree é uma proposta ousada e bem conseguida, especialmente considerando que vem de um estúdio ainda relativamente desconhecido. O jogo pode não reinventar o género, mas refina muitos dos elementos que o definem e oferece uma experiência coesa, desafiante e visualmente impactante. O seu mundo sombrio, aliado a uma jogabilidade sólida e à liberdade de exploração, fazem com que cada momento passado em Faeldumm seja significativo. É verdade que a narrativa deixa algo a desejar em termos de envolvimento imediato, e que a árvore de habilidades poderia ser mais impactante, mas esses aspetos não chegam para comprometer o valor da experiência. A forma como o jogo convida à descoberta, recompensa a atenção ao detalhe e respeita o tempo do jogador com funcionalidades práticas como a viagem rápida e a marcação de pontos no mapa é louvável. Para os fãs de jogos de ação com inspiração souls-like, Mandragora oferece uma alternativa refrescante que não depende apenas da dificuldade para impressionar. E para os amantes de mundos de fantasia sombria, este título é quase obrigatório. Em 2025, num ano cheio de grandes lançamentos, Mandragora: Whispers of the Witch Tree merece um lugar entre os destaques. É um jogo que, mesmo com algumas falhas, consegue deixar uma marca duradoura.