Legends of the Round Table é um RPG tático baseado nas lendas arturianas que promete mergulhar o jogador num mundo medieval autêntico, com um foco notável na fidelidade histórica e estética da época. Desde o primeiro momento, é evidente o cuidado da equipa de desenvolvimento em criar uma experiência que vai muito além dos habituais clichés da fantasia medieval. Este jogo não quer apenas contar histórias inspiradas no ciclo arturiano, quer recriar um ambiente que pareça retirado diretamente de um manuscrito iluminado do século XIII. A demo disponível oferece uma amostra sólida do que esperar da versão completa, apresentando o início da jornada do Rei Artur e permitindo vislumbrar o potencial de um título que, mesmo com algumas falhas, demonstra uma ambição rara no panorama atual dos RPGs por turnos.
Jogabilidade
A jogabilidade de Legends of the Round Table assenta num sistema de combate tático por turnos com um forte ênfase estratégico. As batalhas envolvem decisões importantes, como quando lançar um ataque montado ou quando trocar de armas através dos escudeiros, sendo estas decisões frequentemente definitivas, já que as mortes são permanentes. As escolhas feitas durante o jogo não se limitam ao campo de batalha. Cada decisão fora do combate, desde perdoar um inimigo até envolver-se numa relação romântica, influencia diretamente a honra do jogador e o destino do seu reino. O jogo divide-se em diferentes tipos de missões: algumas são atribuídas a grupos de cavaleiros, outras são aventuras a solo, e há ainda confrontos em maior escala que decorrem em grelhas hexagonais. A presença de um sistema de cartas adiciona uma camada extra de estratégia e aleatoriedade. Algumas cartas, como a do Santo Graal, permitem lançar feitiços poderosos que podem alterar o rumo de uma missão, mas decidir quando usá-las é parte do desafio. Apesar disso, o combate pode tornar-se frustrante. A progressão das lutas envolve o acumular de penalizações (debuffs) que dificultam as verificações e muitas vezes tornam o sucesso quase impossível, retirando espaço para estratégias de recuperação ou viradas dramáticas.
Além disso, a falta de um tutorial aprofundado prejudica a curva de aprendizagem. Conceitos como linha de visão para arqueiros ou regras específicas para certas habilidades não são devidamente explicados, o que pode tornar a experiência inicial algo confusa, especialmente para quem não está habituado a este tipo de sistemas.

Mundo e história
Legends of the Round Table destaca-se na forma como aborda as lendas medievais. Cada aventura é baseada em histórias reais da literatura arturiana, adaptadas com um grande respeito pelas fontes originais. A primeira missão da demo centra-se na ascensão de Artur ao trono, funcionando como uma excelente introdução ao mundo do jogo. Ao longo da narrativa, somos confrontados com intrigas políticas, dilemas morais, romances proibidos e combates sangrentos, tudo aquilo que se poderia esperar de um conto medieval. Os cavaleiros da Távola Redonda não são apenas nomes famosos – como Lancelot, Gawain ou Percival – mas personagens com características e desejos próprios. Cada um tem preferências sociais, virtudes e defeitos que influenciam o seu desempenho nas missões. No entanto, a execução desta complexidade fica aquém das expectativas. As personalidades são pouco desenvolvidas e apresentadas de forma superficial, com apenas uma ou duas frases a caracterizar cada cavaleiro. Sem uma narrativa mais aprofundada ou eventos personalizados para cada personagem, o jogador sente dificuldade em criar ligações emocionais com o seu grupo. Isto é agravado pela ausência de opções de personalização, o que pode limitar a rejogabilidade.
Grafismo
A direção artística de Legends of the Round Table é, sem dúvida, o seu maior trunfo. Inspirada nos manuscritos iluminados do século XIII, toda a arte do jogo foi desenhada à mão por especialistas em pintura medieval, utilizando técnicas e pigmentos autênticos da época. O resultado é uma estética única e absolutamente deslumbrante, que dá a sensação de estarmos a folhear um livro antigo, onde as imagens saltam da página com vida própria. As animações, embora simples, estão bem integradas com este estilo visual e contribuem para o charme do jogo. A paleta de cores é cuidadosamente escolhida para refletir os tons naturais disponíveis na Idade Média, dando uma coerência visual rara num jogo deste tipo. Os menus, apresentados como páginas de um livro, reforçam ainda mais a imersão e mostram uma atenção ao detalhe louvável. Apesar disto, a interface pode tornar-se confusa, especialmente para jogadores novos. Muitos elementos do UI não indicam claramente se podem ser clicados ou se estão bloqueados, e a ausência de um botão universal de retrocesso em todos os menus acaba por ser uma falha irritante numa experiência que tenta ser tão polida.

Som
A componente sonora do jogo é outro dos pilares fundamentais da sua atmosfera. A banda sonora é composta por peças medievais autênticas do século XIII, interpretadas com instrumentos de época como alaúdes, harpas e violas. Esta escolha confere ao jogo um ambiente sonoro extremamente fiel e envolvente, onde cada nota reforça a sensação de estarmos a viver uma história antiga. Os temas musicais variam entre melodias melancólicas e composições mais heroicas, acompanhando com elegância os momentos narrativos e os confrontos. Um destaque especial vai para a participação da cantora Anne Azéma, do Boston Camerata, cuja interpretação dá vida às canções e acrescenta uma camada de autenticidade difícil de replicar. A narração é igualmente competente e contribui para manter o jogador imerso na narrativa, sem nunca parecer excessiva ou deslocada.
Conclusão
Legends of the Round Table é um jogo que brilha intensamente no seu compromisso com a autenticidade histórica e estética. A arte é magnífica, a música envolvente e a ambientação cuidadosamente estudada. A demo apresenta uma base sólida e promissora, que certamente encantará os fãs da lenda arturiana e da história medieval em geral. Contudo, o jogo está longe de ser perfeito. O sistema de combate, embora interessante, carece de equilíbrio e de um melhor tutorial. A ausência de personalização e a superficialidade das personagens levantam dúvidas quanto à longevidade e profundidade da experiência a longo prazo. Há também algumas falhas técnicas menores e problemas na interface que comprometem a fluidez da navegação.
No estado atual, Legends of the Round Table é uma proposta fascinante, mas que exige paciência e dedicação. Para quem aprecia jogos com forte carga histórica e não se importa com uma curva de aprendizagem mais exigente, vale a pena experimentar a demo. No entanto, quem procura uma experiência mais acessível ou personagens com narrativas ricas e diferenciadas poderá sentir-se desapontado. O potencial está todo lá. Resta saber se a versão final conseguirá limar as arestas e entregar uma experiência à altura da sua impressionante apresentação. Se assim for, estaremos perante uma das obras mais originais do género nos últimos anos.