Scrapbooking é uma atividade frequentemente associada ao mundo físico, feita de papel, cola e recordações. Não é habitual vermos este passatempo representado nos videojogos, mas Instants procura precisamente preencher esse vazio. Desenvolvido como uma experiência calma, emocional e criativa, Instants leva-nos numa jornada através dos álbuns de fotografias de uma família fictícia, transformando memórias em puzzles e páginas decoradas com carinho. O jogo mistura lógica com estética, convidando-nos a organizar fotografias cronologicamente e, se quisermos, a embelezá-las com todo o tipo de adornos. O resultado é uma experiência que apela tanto ao coração como à mente, com uma forte componente visual e um ritmo suave, ideal para quem procura uma alternativa tranquila aos jogos mais intensos do mercado.
Jogabilidade
A base mecânica de Instants assenta em dois pilares: resolver puzzles de observação e decorar páginas de álbuns. Cada um dos 18 capítulos do jogo apresenta-nos uma série de fotografias relacionadas com um momento específico da vida de um membro da família. Essas imagens surgem desordenadas e cabe ao jogador organizá-las por ordem cronológica. Esta tarefa, embora pareça simples à partida, exige atenção ao detalhe: o penteado de uma personagem muda? A parede ao fundo está pintada? As crianças aparentam ter crescido? Tudo são pistas subtis que ajudam a encontrar a sequência correta.
Para facilitar, existe um sistema de setas coloridas que indica se as fotografias estão na ordem certa, se há imagens fora do lugar ou se faltam elementos entre elas. No entanto, este sistema nem sempre funciona de forma fiável ao mudar de página, deixando por vezes o jogador na dúvida sobre o erro cometido. Apesar disso, a maioria dos puzzles está bem construída e proporciona momentos de genuína satisfação ao serem resolvidos, especialmente nos capítulos com mais de 10 fotografias, onde o desafio é mais envolvente.

Mundo e história
Embora Instants não tenha um enredo no sentido tradicional, o jogo constrói uma narrativa emocional através de pequenos fragmentos visuais e contextuais. Cada capítulo representa um momento na vida de um familiar, partindo do gesto inicial de criar um álbum para alguém querido. O jogador vai assim reconstruindo eventos marcantes da família, com ajuda de postais e mensagens escritas no verso de algumas fotos.
Este estilo de storytelling ambiental é eficaz na criação de empatia, mas peca por alguma falta de profundidade emocional. Os membros da família não têm grande presença para além das imagens e postais, o que limita a ligação do jogador às suas histórias. A sensação é mais de observador externo do que de participante, e embora isso funcione bem no contexto do puzzle, deixa algo a desejar do ponto de vista narrativo. Ainda assim, a estrutura episódica do jogo permite-nos ver a evolução dos personagens ao longo do tempo, o que confere uma certa coesão ao todo.
Grafismo
Visualmente, Instants é um jogo acolhedor, com uma paleta de cores suaves e elementos gráficos que evocam calor humano e nostalgia. As fotografias são ricas em pormenores, e o estilo artístico é suficientemente limpo para facilitar a observação, mas suficientemente expressivo para transmitir emoções. O interface para scrapbooking é intuitivo e agradável, com ferramentas de arrastar e largar que permitem ao jogador brincar com autocolantes, fitas decorativas, padrões de papel e tipos de letra. À medida que se avança no jogo, vão-se desbloqueando mais opções, o que encoraja a criatividade sem forçar o jogador a participar nessa vertente.
No entanto, falta algum reconhecimento mais marcante do esforço de decoração. Quando se termina uma página particularmente bem conseguida, não há uma celebração do trabalho feito. O jogo avança simplesmente para a próxima etapa, o que pode deixar um certo vazio para quem investiu tempo a personalizar o álbum. Um modo de galeria ou uma forma de rever as páginas completadas com destaque teria sido bem-vindo.

Som
A banda sonora de Instants complementa bem o seu tom geral: é serena, doce e discreta. Os temas musicais são compostos para não distrair do puzzle, mas ainda assim ajudam a criar uma atmosfera relaxante. Há um carácter quase meditativo nas melodias, que reforça o sentimento de calma que o jogo procura transmitir. Os efeitos sonoros, embora mínimos, são eficazes. Desde o som das páginas a virar até ao clique suave de colocar um autocolante, tudo é pensado para reforçar a sensação de estar a manusear algo físico, mesmo sendo digital.
Uma curiosidade simpática é a possibilidade de desbloquear snacks digitais, como bolachas e bolos, que o jogador pode clicar para consumir enquanto joga. Esta funcionalidade não tem impacto prático na jogabilidade, mas contribui para o ambiente aconchegante do jogo. É um toque irreverente que reforça o espírito familiar e acolhedor de Instants.
Conclusão
Instants é uma proposta invulgar mas encantadora dentro do panorama dos videojogos. A sua mistura de puzzles baseados na observação e ferramentas de scrapbooking resulta numa experiência leve, criativa e relaxante. Embora não tenha uma narrativa particularmente profunda nem momentos de grande impacto emocional, consegue transmitir uma mensagem calorosa sobre a importância das memórias e dos laços familiares. Os pequenos problemas com o sistema de dicas não comprometem a experiência, e a liberdade de decorar ao gosto do jogador torna cada capítulo mais pessoal.
Não é um jogo para quem procura ação ou desafio constante, mas sim para quem aprecia experiências mais tranquilas e contemplativas. Em suma, Instants oferece uma viagem serena através das recordações de uma família, com puzzles inteligentes e uma estética encantadora. Se a ideia de organizar fotografias e decorar álbuns ao som de música suave soa apelativa, então este jogo merece uma visita.