Sintopia é um daqueles jogos que deixa logo uma marca desde o primeiro instante. A sua demo apresenta-se como uma fusão irreverente entre os jogos de gestão de cidades e os clássicos god-games dos anos 90, com uma boa dose de humor negro à mistura. Este não é mais um city builder tradicional, mas antes uma proposta que brinca com o poder absoluto de uma entidade divina, deixando ao jogador a escolha entre a benevolência e o puro caos. Ao misturar mecânicas de Black & White com a estrutura de SimCity, Sintopia cria algo ao mesmo tempo familiar e fresco, com um estilo visual leve que contrasta deliciosamente com a sua crueldade latente.
Jogabilidade
Em Sintopia, o jogador assume o papel de uma divindade caprichosa, com uma mão gigante como principal ferramenta de intervenção. Esta mão tanto pode ajudar a construir uma cidade próspera como dizimar os seus habitantes sem qualquer remorso. A jogabilidade oscila entre a gestão cuidadosa da aldeia na superfície e a exploração lucrativa do submundo, onde as almas dos infelizes são recicladas em troca de recursos. Este equilíbrio entre criar e destruir é o verdadeiro coração do jogo. Podem-se acender tochas para queimar casas, lançar vacas contra aldeões ou até empurrá-los diretamente para abismos infernais, tudo em nome da diversão ou da eficiência divina. Cada ação tem consequências e encontrar o ponto ideal entre o desenvolvimento da aldeia e a exploração cruel do além torna-se rapidamente viciante.

Mundo e história
Embora não tenha ainda uma narrativa profunda nesta fase da demo, Sintopia deixa entrever um mundo onde o culto à divindade é central. Os aldeões não são apenas peões passivos, mas habitantes com os seus próprios nomes, que podemos personalizar ao nosso gosto. O jogador é simultaneamente adorado e temido, e esta dualidade está presente em cada decisão. Nomear os plebeus com nomes de amigos ou figuras públicas e depois decidir o seu destino ao estilo de um juiz celestial dá ao jogo uma camada de interatividade inesperada. O mundo parece estar construído em torno desta mecânica de adoração/julgamento, sugerindo que no futuro poderá evoluir para algo com mais profundidade narrativa.
Grafismo
O estilo visual de Sintopia é claramente cartunesco, mas isso não significa que lhe falte detalhe. Pelo contrário, ao aproximar a câmara é possível observar pequenas animações e pormenores que mostram um cuidado notável no design. Os aldeões têm expressões exageradas e engraçadas, e o mundo reage de forma visível às ações do jogador, seja através de explosões, fogos ou reações de pânico em massa. A clareza visual ajuda bastante a manter o controlo mesmo quando o caos toma conta do ecrã. Este estilo gráfico funciona muito bem com o tom geral do jogo, criando um contraste eficaz entre o humor e a violência quase absurda das mecânicas.

Som
Apesar de ainda estar numa fase preliminar, o trabalho sonoro em Sintopia já demonstra personalidade. Os sons dos aldeões, os efeitos das ações divinas e o ambiente geral contribuem para a atmosfera cómica e frenética do jogo. Os efeitos sonoros, em particular, têm um papel importante ao reforçar o impacto das decisões mais destrutivas, como atirar um aldeão de um penhasco ou incinerar uma casa. A música, por sua vez, não se sobrepõe à ação mas acompanha bem o ritmo dos acontecimentos, mantendo o foco no que está a acontecer no ecrã. Ainda assim, seria interessante ver uma maior variedade de faixas e vozes nas versões futuras.
Conclusão
A demo de Sintopia é uma agradável surpresa para quem sente saudades dos tempos em que ser uma divindade implicava tomar decisões questionáveis só pelo prazer de ver o resultado. Combinando mecânicas clássicas com uma abordagem moderna e um humor descarado, o jogo consegue destacar-se num género muitas vezes repetitivo. As falhas de desempenho presentes na demo não comprometem a experiência geral, e a existência de um tutorial bem estruturado ajuda bastante a entrar no espírito do jogo. Se a versão final conseguir expandir o conteúdo sem perder este equilíbrio entre caos e construção, Sintopia poderá facilmente tornar-se num dos títulos mais memoráveis do seu género. É um jogo onde construir uma utopia pode ser o objetivo, mas mandar tudo abaixo continua a ser estranhamente mais divertido.